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Hanseníase: Justiça é lenta para as crianças brasileiras enviadas para “preventórios”, diz especialista da ONU

GENEBRA – Na última quarta-feira (21), uma especialista em direitos humanos da ONU relatou que o Brasil tem uma oportunidade de reconhecer e promover a reparação de pessoas que, quando crianças, foram separadas dos seus pais afetados pela hanseníase e, assim, segregados da sociedade.

Entre 1923 e 1986, cerca de 16.000 crianças foram separadas dos seus pais infectados pela doença e enviadas para instituições do governo, em conformidade com a política de segregação forçada praticada pelo Estado na época. Durante a última década, foram apresentados vários casos pelas crianças separadas nos tribunais estaduais, mas os processos ainda estão pendentes.

“O Supremo Tribunal tem a oportunidade de corrigir essa injustiça que, dados os seus efeitos duradouros, deve ser considerada uma violação permanente de natureza imprescritível”, disse Alice Cruz, que em 2017 tornou-se a primeira Relatora Especial da ONU para a eliminação da discriminação contra as pessoas afectadas pela hanseníase e os seus familiares. “Estas pessoas suportaram uma vida inteira de sofrimento como consequência deste tratamento desumano e, para muitos, que agora são idosos, não há muito tempo para que vejam os erros do passado sendo corrigidos”. O caso deverá ser ouvido pelo Supremo Tribunal antes do final do ano.

“O Brasil tem o dever de oferecer reparações totais, incluindo um pedido de desculpas, memorialização e reabilitação, aos filhos separados de pessoas afetadas pela hanseníase, em conformidade com as normas internacionais de direitos humanos”, disse Cruz, acrescentando que tem exigido repetidamente ações das autoridades. (Ver relatório de missão e carta de alegação).

A especialista da ONU afirmou que muitas crianças que foram para as instalações estatais – conhecidas como “preventórios” – relataram ter sido abusadas. Durante a sua visita ao Brasil em Maio de 2019, Cruz ouviu testemunhos de várias crianças que foram separadas, hoje adultos.

“Quando era bebê, fui tirada da minha mãe e enviada para o preventório”, disse uma das vítimas. “Quando eu tinha sete anos, o sapateiro que trabalhava lá disse que eu era uma menina bonita e, por isso, ele seria o meu pai. Eu fiquei feliz porque sentia muito a falta dos meus pais. Então, o sapateiro me obrigou a sentar no seu colo e começou a me apalpar. Ele disse para ficar calada e me fez sentir o cheiro da cola para sapatos, o que me fez sentir tonta. Brincaram com a minha vida”.

“O Brasil tem feito vários esforços na proteção dos direitos das pessoas afetadas pela hanseníase, mas é preciso fazer mais. Especialmente quando falamos sobre reparação de direitos dos seus filhos e filhas”, disse a Relatora Especial. “Espero que a decisão do Supremo Tribunal brasileiro reconheça finalmente os direitos das vítimas enquanto estas estiverem vivas. Proceder desta forma é um avanço importante na história sombria da hanseníase em todo o mundo”. 

FONTE: UN Special Procedures – Human Rights

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